Olá galera, vamos dar continuidade sobre microbiologia?
Hoje iremos abordar 2 grupos importantes: Príons e os Parasitos.
Príons
Os príons são proteínas infecciosas derivadas de proteínas celulares (PrPc) do organismo hospedeiro e que diante de alterações conformacionais e pós-traducionais tornaram-se patogênicas, levando a isoformas distintas (1).
Essa proteína celular está presente na superfície neuronal e quando infecciosa leva a deposição e acúmulo no sistema nervoso central (SNC), acarretando doenças neurodegenerativas fatais. Esses príons podem ser introduzidos no organismo, seja por meios externo ou por mutação no gene da proteína celular, levando a isoformas distintas das PrPc em cópias de si mesma (2).
Após a primeira transformação de um príon, o processo se repete exponencialmente até que os danos sejam irreversíveis.
É importante ressaltar que a sequência primaria dessa proteína não é alterada, visto que as modificações são em sua conformação tridimensional o que acarreta a diferenciação de suas funções. A proteína celular é formada principalmente por hélices alfa, e poucas folhas betas, enquanto a proteína príon patológica consiste em grandes partes de folhas beta. O fator responsável por essas alterações ainda é desconhecido (3).
Uma vez que o PrPc adota a estrutura com mais folhas beta, essas proteínas são então englobadas por vesículas intracelulares e acabam se acumulando no interior dos lisossomos o que acarreta a lise do mesmo levando a destruição celular e liberação desses príons (4).
Vamos agora conhecer um pouco das principais doenças ocasionadas por Príons?
A Doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ) é uma doença fatal que provoca demência e anormalidades nos movimentos, causada por danos nos tecidos cerebrais. Pode ocorrer espontaneamente, ser hereditária ou ser transmitida por contato com o tecido infectado, como durante um transplante ou ao comer carne contaminada.
A condição provoca mudanças de personalidade, ansiedade, depressão e perda de memória, geralmente em alguns meses e em alguns casos as pessoas entram em coma. Como não existe nenhum tratamento eficaz, o objetivo é aliviar a dor e os sintomas (1,3,5).
Síndrome de Gerstmann-Sträussler-Scheinker (SGSS) é uma doença neurodegenerativa genética muito rara. Geralmente começa entre os 35 e os 55 anos, com sobrevida média de 5 anos após o início dos sintomas. Os pacientes apresentam disfunção cerebelar com marcha instável, disartria e nistagmo. Paralisia do olhar, surdez, demência, parkinsonismo, hiporreflexia e respostas extensoras plantares também são comuns (1,3).
Insônia Familiar Fatal é uma doença hereditária causada por uma mutação na proteína PrPc (príons celulares considerados comuns a todas as células que não manifestam nenhum mal ao organismo). O acúmulo e deposição dessas proteínas leva a uma interferência no sono o que acarreta a deterioração da função mental e perda de coordenação. A morte ocorre em alguns meses ou até alguns anos (6).
A insônia fatal se apresenta em duas formas:
Familiar: Neste caso é chamada de insônia familiar fatal e é hereditária, pois é devido a uma mutação específica no gene que codifica uma proteína normal chamada proteína príon celular (PrPc).
Esporádica: Esta forma ocorre espontaneamente, sem uma mutação genética.
A insônia familiar fatal e a insônia fatal esporádica distinguem-se de outras doenças causadas por príons porque afetam predominantemente uma zona do cérebro que induz o sono, o tálamo (6).
Na insônia familiar fatal, os sintomas podem começar quando a pessoa chega ao fim dos 20 anos até o início dos 70 anos de idade (a média é aos 40 anos). A morte geralmente ocorre entre alguns depois do início dos sintomas.
A forma esporádica tem início tardio com uma expectativa de vida um pouco maior. Os sintomas incluem dificuldade em manter o sono até não conseguirem mais dormir de fato acarretando a perda da função mental e coordenação, chamada de ataxia. Não há tratamento eficaz, apenas medidas para alivio dos sintomas.
A encefalopatia espongiforme bovina é uma doença cerebral que acomete os bovinos adultos que pode ser transmitida aos seres humanos por carne contaminada. É conhecida popularmente como doença da vaca louca.
Os seres humanos podem adquirir a doença pela ingestão de produtos de carne contaminados. A doença é caracterizada pela rápida deterioração mental, geralmente dentro de alguns meses. A maioria das pessoas, eventualmente, entra em coma.
O tratamento se concentra em manter a pessoa o mais confortável possível (3).
Enfermidade Debilitante Crônica (EDC) é uma doença neurodegenerativa que afeta cervídeos, incluindo cervos e alces. A doença da debilidade crônica pode ser devastadora em rebanhos de criação. Essa doença é sempre fatal quando os sinais clínicos aparecem e a maioria ou todo o rebanho pode eventualmente se infectar.
É uma das doenças priônicas mais difíceis de controlar; os príons da EDC são transmitidos de um animal para outro e também podem ser disseminados pelo ambiente contaminado por até dois anos ou mais. Ainda não há indícios de transmissão em humanos, no entanto, sabe-se que o cozimento da carne não destrói os príons tornando-se uma preocupação para saúde humana e animal (7).
Parasitos
Um parasita é um organismo que vive dentro ou sobre um hospedeiro e consegue os nutrientes necessários para viver às custas dele, numa relação denominada parasitismo.
As principais classes de parasitas são os: protozoários, helmintos e os ectoparasitas.
Devido ao foco da postagem ser relacionada aos microrganismos, a abordagem do texto será direcionada aos protozoários.
O termo protozoário, na verdade, não tem valor taxonômico, ele é usado para definir seres unicelulares eucarióticos e heterótrofos, que podem ser encontrados em diversos habitats que possuam água. Eles podem ser de vida livre, ou parasitos por natureza.
Os protozoários parasitas têm uma grande capacidade de reprodução dentro dos humanos, o que acaba facilitando sua sobrevivência e gerando grandes infecções a partir de um único organismo.
São geralmente transmitidos por água e alimentos contaminados por fezes, que contém os cistos desses microrganismos. Mas também podem ser transmitidos por alguns insetos, como a malária que é transmitida pela picada do mosquito Anopheles.
Os protozoários que podem infectar os humanos podem ser classificados pela maneira como se movimentam:
Filo Sarcodina - Locomoção realizada por pseudópodes, ex: Ameba
Filo Flagellata - Locomoção por flagelos, ex: Tripanossomos
Filo Ciliata - Movimentação por cílios, ex: Paramécios
Filo Sporozoa - Sem meio de movimentação, ex: Plasmódios
Estudar esses microrganismos e seus contágios são de extrema importância para evitar uma possível contaminação dos mesmos.
As protozooses por exemplos, são muito frequente em crianças, sendo considerado um grande problema da saúde pública, isso ocorre devido à falta de aplicação de uma higiene básica adequada para esse grupo. Iremos dar enfoque a amebíase e tripanossomíse.
Amebíase
A amebíase é uma infecção humana localizada no intestino grosso ocasionada pela Entamoeba histolytica, protozoário extracelular que leva a infecção sintomática chamada de amebíase intestinal, enfermidade complexa.
Os sintomas variam de dor abdominal e colite ulcerosa com muco e sangue (disenteria amebiana) a apendicite e úlceras (ameboma). Ocasionalmente, os parasitas viajam pela veia porta para o fígado e produzem a principal infecção extra-intestinal, o abscesso hepático amebiano, ou para os pulmões e o cérebro, principalmente em pacientes imunocomprometidos (8). Ambos enfermidades podem ser fatais quando não tratadas.
O gênero Entamoeba possui três espécies que podem ocasionar a amebíase assintomática (E. dispar, E. moshkovskii e E. bangladeshi), pois segundo a OMS apenas 10% dos casos de amebíase sejam consequência de infecções por E. histolytica. A infecção por E. histolytica é considerada multifatorial e depende da interação entre ameba, hospedeiro e microbiota ou em alguns casos até com possíveis microrganismos patogênicos (8).
O ciclo da ameba não necessita de um vetor e a infecção se inicia com um cisto resistente que pode ser ingerido por água ou alimentos contaminados. Quando os cistos atingem o íleo terminal formam-se os trofozoítos que são moveis e potencialmente invasivos. Neste local as amebas se proliferam e se aderem a mucosa intestinal, invadindo deste modo o intestino grosso levando a modificações na absorção de água, acarretando diarreia e colite. As fezes dos organismos contaminados contêm inúmeros cistos, o que poderá reiniciar o ciclo em outros hospedeiros (8).
Tripanossomíase
O gênero Trypanosoma é um dos mais importantes dentro da família Trypanosomatidae pois inclui espécies patogênicas humanas importantes, como: Trypanosoma cruzi, agente da doença de Chagas (ou Tripanossomíase americana), Trypanosoma rhodesiense e Trypanosoma gambiense, agentes da doença do sono. Em animais ainda tem-se algumas espécies como é o caso do Trypanosoma brucei, Trypanosoma equiperdum e Trypanosoma equinum (9).
Para que seu ciclo seja completo este tipo de parasito necessita de um vetor e baseado nisso o gênero Trypanosoma foi dividido em dois grupos.
Stercoraria - inclui tripanosomas que se desenvolvem no tubo digestivo do vetor progredindo para o intestino liberando deste modo formas infectantes pelas fezes. Aqui temos o T. cruzi e o T. lewisi.
Salivaria - inclui tripanosomas que se desenvolvem inicialmente no tubo digestivo e que posteriormente atravessam o epitélio digestivo e atingem as glândulas salivares onde podemos encontrar as formas infectantes que são inoculadas mecanicamente. Nestes grupos encontramos o T. brucei, T. congolense e T. rangeli.
O T. cruzi é bastante conhecido devido as recorrentes infecções e por poder levar a doença de chagas, popularmente conhecida no Brasil. Esse protozoário pode levar a infecções agudas assintomáticas em sua maioria onde apenas 5% das crianças infectadas possam apresentar febre, dor de cabeça, sonolência, taquicardia, edema e falta de ar.
A morbidade e mortalidade na fase aguda da infecção é baixa. No entanto, a infecção pelo T. cruzi pode levar a uma fase intermediária crônica vitalícia que também ocorre na ausência de manifestações clínicas, mas que pode levar ao desenvolvimento da doença de chagas (cerca de 30% dos casos). A doença de Chagas é crônica e fatal devido ao aumento do coração e insuficiência cardíaca, polineuropatia e síndromes neuroendócrinas, esta última mais rara (9).
Conclusão
Diante do que vimos hoje pode-se notar como a microbiologia é heterogênea e pode apresentar uma diversidade a patologia tanto humanas como animal. Conhecer esse universo é muito importante para que possamos buscar soluções possíveis para tratamento, diagnostico e até profilaxia. Hoje abordamos sobre os príons e os parasitos, dando um enfoque para os mais comuns aqui no Brasil.
No entanto, vale ressaltar a importância em conhecer também microrganismos não patogênicos, pois os mesmos podem apresentar substancias com potencial biotecnológico, seja para saúde, alimento ou indústria.
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Referências:
1. Chen C, Dong X. Therapeutic implications of prion diseases. Biosafety and Health. Published online September 9, 2020. doi:10.1016/j.bsheal.2020.09.001
2. Oamen HP, Lau Y, Caudron F. Prion-like proteins as epigenetic devices of stress adaptation. Experimental Cell Research. 2020;396(1):112262. doi:10.1016/j.yexcr.2020.112262
3. Prion Diseases | CDC. Accessed October 18, 2020. https://www.cdc.gov/prions/index.html
4. Mastrianni JA. The genetics of prion diseases. Genetics in Medicine. 2010;12(4):187-195. doi:10.1097/GIM.0b013e3181cd7374
5. Gambetti P, Kong Q, Zou W, Parchi P, Chen SG. Sporadic and familial CJD: Classification and characterisation. British Medical Bulletin. 2003;66:213-239. doi:10.1093/bmb/66.1.213
6. Shi XH, Han J, Zhang J, et al. Clinical, histopathological and genetic studies in a family with fatal familial insomnia. Infection, Genetics and Evolution. 2010;10(2):292-297. doi:10.1016/j.meegid.2010.01.007
7. Rovid Spickler A. Enfermidade Debilitante Crônica.; 2008. Accessed October 18, 2020. www.cfsph.iastate.edu
8. Carrero JC, Reyes-López M, Serrano-Luna J, et al. Intestinal amoebiasis: 160 years of its first detection and still remains as a health problem in developing countries. International Journal of Medical Microbiology. 2020;310(1):151358. doi:10.1016/j.ijmm.2019.151358
9. Gomes C, Almeida AB, Rosa AC, Araujo PF, Teixeira ARL. American trypanosomiasis and Chagas disease: Sexual transmission. International Journal of Infectious Diseases. 2019;81:81-84. doi:10.1016/j.ijid.2019.01.021
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